Apesar de ser majoritariamente composto por mulheres, a área ainda não sabe lidar com a presença delas
Desde cedo, as mulheres testemunham a substituição e diminuição de seus espaços de fala na sociedade. Por (muitas!) vezes somos silenciadas, marginalizadas e subestimadas em diversos setores. E foi por esse motivo que de início, escolhi fazer jornalismo: para dar voz a minha e a tantas outras causas que não estampavam os jornais com tanta frequência.
Em 2018, ingressei na faculdade com a crença em um jornalismo que tinha como preceito fundamental informar e moldar a opinião pública com justiça e imparcialidade, dentro e fora das telinhas. No entanto, na prática, vemos que tais princípios não são cumpridos quando se trata dos direitos das mulheres, pois esbarramos nas raízes de uma sociedade que ainda não está bem-preparada para a igualdade de forma geral. Mesmo representando a maioria da categoria de jornalistas, enfrentamos diversos desafios e preconceitos no exercício de nosso ofício.
Colocando em números, nas redações, de acordo com dados do Instituto Reuters, apesar de representarem 58% da categoria de jornalistas, apenas 13% dos cargos de chefia são ocupados por mulheres. Já nas agências de comunicação, com a participação de 541 profissionais em cargos de gestão, outra pesquisa realizada pela Operand permite afirmar que, dos participantes, apenas 32,72% se identificam como mulheres, o que não chega nem a 1/3 do total. Essa disparidade é alarmante e revela a existência de barreiras que impedem o avanço das mulheres na hierarquia profissional.
Além da sub-representação nos cargos de liderança, as mulheres são alvos de estereótipos de gênero, sendo questionadas em sua capacidade intelectual ou tendo sua aparência física colocada em foco, em detrimento de seu trabalho e expertise. A maternidade, que deveria ser um momento sublime, também representa um desafio.
A falta de suporte e estruturas adequadas para conciliar a vida profissional com a responsabilidade da criação dos filhos coloca essas profissionais em uma posição desvantajosa. As profissionais mães, sobretudo as mães atípicas, que possuem filhos com necessidades especiais ou enfrentam desafios adicionais, enfrentam dificuldades extras para se manterem no mercado de trabalho jornalístico, sendo substituídas por profissionais sem filhos, ou até mesmo, por homens.
Mas, estamos de fato contrariando as estatísticas?
Contudo, aos poucos, as mulheres vêm ressignificando esses espaços. Com figuras como Maju Coutinho, Natuza Nery, Mari Palma e Renata Lo Prete, elas seguem no front mostrando competência, talento e uma perspectiva única, buscando romper com os estereótipos de gênero e quebrar as barreiras que as impediam de alcançar posições de destaque.
Outro ponto de conquista, é o destaque em áreas específicas do jornalismo, como o investigativo, trazendo à tona escândalos e irregularidades que antes passavam despercebidos, envolvendo reportagens que abordam questões de gênero, violência contra a mulher, igualdade salarial e outros temas relevantes para a sociedade.
A presença feminina também tem contribuído para uma maior sensibilidade e empatia na cobertura de notícias. As mulheres estão trazendo uma perspectiva diferenciada para as pautas, valorizando histórias que antes eram negligenciadas e promovendo uma abordagem mais inclusiva e equilibrada.
Como fechar a equação da equidade?
Porém, ainda há muito a se fazer. Para avançar na construção de um cenário mais igualitário no jornalismo, é fundamental implementar políticas voltadas especificamente para as mulheres. Cláusulas trabalhistas em acordos ou convenções coletivas podem buscar vedar a diferença salarial em função do gênero, uma prática inconstitucional que ainda persiste em algumas redações.
Das redações às agências, deve-se criar um ambiente de trabalho seguro e inclusivo, livre de quaisquer tipos de assédio. É fundamental que todas as profissionais sejam tratadas com respeito e tenham oportunidades iguais de crescimento e desenvolvimento de carreira, promovendo a diversidade e a representatividade, garantindo a presença de mulheres em todas as áreas do jornalismo, incluindo as editorias tradicionalmente dominadas por homens.
Esperamos que o jornalismo um dia seja o que tanto transmitimos. Será que um dia iremos tirá-lo dos empoeirados estatutos e livros teóricos de faculdade?
Stephanie Ferreira é Estrategista de Comunicação na IDEIACOMM.